Independência Tecnológica: O Auge e Declínio da Indústria Eletrônica Brasileira

Até o final dos anos 80, o Brasil vivia um período marcante na tentativa de construir uma indústria de eletrônicos autônoma, focada especialmente em computadores e periféricos. Esta iniciativa nacional, embora limitada por diversas barreiras regulatórias e tecnológicas, refletia um desejo profundo de autossuficiência em um setor dominado por gigantes estrangeiros.

Eu particularmente estudei o curso de Técnico em Eletrônica entre 1981 a 1984, pois era o máximo em termos de tecnologia que os jovens apaixonados pelo pouco que víamos na época tínhamos a disposição.

Penei muito para estudar, tive muitas dificuldades, porém conclui meu curso e passei por outra saga que era trabalhar na área que eu desejava que era Projetos.

Depois de muito custo entrei em uma empresa que produzia periféricos para computadores, coisas que hoje nem existem mais, porém eram um produto real naquela época. Eu presenciei esse “apogeu” de tecnologia própria no Brasil. E eu sou testemunha de que todos que trabalhavam em P&D na época eram muito mais criativos que os “estrangeiros”, um único profissional no Brasil fazia o que uma equipe inteira fazia nos países desenvolvidos.

Durante essa época, uma série de políticas protecionistas, como a “Lei da Informática” de 1984, foram implementadas com o objetivo de fomentar a indústria local de eletrônicos. Essa legislação impunha severas restrições à importação de componentes e tecnologias avançadas, principalmente microchips, que eram a espinha dorsal da nova era computacional que se desenrolava globalmente. Como consequência, empresas brasileiras foram forçadas a desenvolver suas próprias soluções.

Essa lei foi tão impactante no cenário global que hoje até sansões politicas ao Brasil. Em resposta às práticas protecionistas do Brasil, o presidente dos Estados Unidos na época, Ronald Reagan, impôs sanções comerciais ao Brasil em 1987, aumentando as taxas de importação de produtos brasileiros e proibindo a importação de certos produtos de informática. Essas medidas visavam compensar os prejuízos causados às empresas estadunidenses pela política brasileira, que foi criticada por engessar o desenvolvimento econômico do país.

A política de reserva de mercado foi alvo de críticas tanto no Brasil quanto internacionalmente. Críticos apontavam que essa política resultava na obrigação dos consumidores de adquirir equipamentos obsoletos e de qualidade inferior a preços exorbitantes. Além disso, alegava-se que a reserva de mercado favorecia a pirataria de hardware e software, com empresas brasileiras fabricando equipamentos ou desenvolvendo sistemas que copiavam projetos estrangeiros, principalmente dos Estados Unidos.

Isso de fato existiu, e ninguém da época pode negar, porém o que se fazia na época é o mesmo que foi feito por alguns países asiáticos, que é “copiar e melhorar” alguma tecnologia existente. Países hoje ovacionados por muitos que participam dessa rede do Linkedin.

Nesse item gosto de ressaltar que enquanto existiam lá fora microprocessadores, microcontroladores, tínhamos ainda de usar chips dos anos 70 (que ainda eram usados lá fora também), mas que fazíamos com que os resultados fossem próximos.

Empresas como a Cobra Computadores e a Itautec se destacaram por montar linhas de produção robustas e investir em departamentos de pesquisa e desenvolvimento. A inovação era palpável, não apenas em termos de hardware, mas também no desenvolvimento de softwares e sistemas operacionais adaptados às realidades locais. A indústria brasileira, embora tecnologicamente atrasada em comparação com o exterior, demonstrava uma criatividade ímpar, superando obstáculos através de um engenhoso processo de engenharia reversa e adaptações.

A chegada do presidente Fernando Collor de Mello no início dos anos 90 marcou uma virada drástica para essa indústria nascente. Com a revogação da “Lei da Informática” em 1992, Collor abriu as portas do mercado brasileiro para produtos eletrônicos estrangeiros, visando modernizar a infraestrutura tecnológica do país. De imediato, o Brasil viu uma inundação de computadores modernos, componentes de alta performance e tecnologias que eram, até então, objeto de grande desejo.

Porém esses computadores ao contrário do que muitos podem pensar hoje em dia, não eram populares e sim restritos a poucas empresas que tinham capacidade financeira de adquiri-los. Mas foram um inicio para a popularização da Informática como conhecemos hoje.

Embora a abertura comercial tenha democratizado o acesso à tecnologia de ponta, beneficiando consumidores e empresas que dependiam de tais ferramentas para competir globalmente, ela também teve efeitos colaterais significativos. A indústria eletrônica brasileira, que lutava para competir em pé de igualdade com os gigantes tecnológicos devido a restrições anteriores, encontrou-se incapaz de sobreviver sem proteção. Muitas empresas fecharam suas portas ou foram forçadas a reestruturar suas operações drasticamente, focando em outros nichos de mercado, como por exemplo apenas serem representantes comerciais de empresas externas.

A extinção da indústria eletrônica nacional consolidou a dependência do Brasil em relação à tecnologia estrangeira. Esse cenário levanta questões críticas sobre a independência tecnológica e o desenvolvimento sustentável. A história serve como um lembrete de que, enquanto o acesso a tecnologias globais pode impulsionar a modernização, a falta de uma estratégia de longo prazo para o desenvolvimento de capacidades internas pode deixar uma nação vulnerável e dependente.

A experiência brasileira com sua indústria de eletrônicos é um estudo de caso valioso sobre os desafios e compromissos enfrentados por países em desenvolvimento em sua busca por autonomia tecnológica. Ao refletir sobre esses eventos, é crucial ponderar sobre o equilíbrio entre abrir mercados e nutrir setores internos, uma decisão que tem implicações profundas para o futuro tecnológico e econômico de qualquer nação.

Hoje somos totalmente dependentes tecnologicamente de outros países, e o que muito ovacionam é algo a se pensar, temos softwares que nem sabemos ao certo o que fazem nas nossas vidas e que a qualquer momento alguém pode simplesmente desligar-nos da tecnologia fascinante que temos hoje.

Um exemplo do que acabei de falar é o evento do Vírus Blaster em 2003, mas isso é assunto para outro artigo.

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